Molhando as Palavras

Blog de curiosidades, opinião, crônicas e afins.

sexta-feira, julho 28, 2006

Com a palavra, Marina Colassanti

Tem acontecido algumas coincidências que não posso ignorar. Toda a vez que escrevo um texto, me aparece alguém, alguma coisa inesperada falando sobre o mesmo assunto. Foi assim com o Pixaim, e agora com o texto da porta. No mesmo dia que o escrevi, fui acompanhar uma matéria fora da Biblioteca. Tínhamos que tirar uma foto para o jornal sobre uma matéria de cursos de literatura. A foto era somente a simulação de uma turma. Porém, a pseudo professora levou a sério e selecionou um texto para ser lido durante a "aula". Não acreditei quando ela terminou. Era justamente o que falava sobre o brasileiro se acostumar com o que tem, sendo um problema ou não. Então, resolvi mostrar pra vocês. De repente muitos já o conhecem. Foi escrito pela Marina Colassanti. Só posso dizer que ela tem toda a razão. Espero que gostem!
EU SEI MAS NÃO DEVIA
Eu sei que a gente se acostuma.Mas não devia.
A gente se acostuma a morar em apartamento de fundos e a não ter outra vista que não as janelas ao redor. E porque não tem vista, logo se acostuma a não olhar para fora. E porque não olha para fora, logo se acostuma a não abrir de todo as cortinas. E porque não abre as cortinas, logo se acostuma a acender mais cedo a luz. E porque à medida que se acostuma, esquece o sol, esquece o ar, esquece a amplidão.
A gente se acostuma a acordar de manhã, sobressaltado porque está na hora.A tomar café correndo porque está atrasado. A ler jornal no ônibus porque não pode perder o tempo da viagem. A comer sanduíches porque já é noite. A cochilar no ônibus porque está cansado. A deitar cedo e dormir pesado sem ter vivido o dia. A gente se acostuma a abrir a janela e a ler sobre a guerra. E aceitando a guerra, aceita os mortos e que haja números para os mortos. E aceitando os números, aceita não acreditar nas negociações de paz. E aceitando as negociações de paz, aceitar ler todo dia de guerra, dos números da longa duração.
A gente se acostuma a esperar o dia inteiro e ouvir no telefone: hoje não posso ir. A sorrir para as pessoas sem receber um sorriso de volta. A ser ignorado quando precisava tanto ser visto. A gente se acostuma a pagar por tudo o que deseja e o que necessita. E a lutar para ganhar o dinheiro com que paga. E a ganhar menos do que precisa. E a fazer fila para pagar. E a pagar mais do que as coisas valem. E a saber que cada vez pagará mais. E a procurar mais trabalho, para ganhar mais dinheiro, para ter com o que pagar nas filas em que se cobra.
A gente se acostuma a andar na rua e ver cartazes, a abrir as revistas e ver anúncios. A ligar a televisão e assistir a comerciais. A ir ao cinema, a engolir publicidade. A ser instigado, conduzido, desnorteado, lançado na infindável catarata dos produtos.
A gente se acostuma à poluição. À luz artificial de ligeiro tremor. Ao choque que os olhos levam na luz natural. Às besteiras das músicas, às bactérias da água potável. À contaminação da água do mar. À luta. À lenta morte dos rios. E se acostuma a não ouvir passarinhos, a não colher frutas do pé, a não ter sequer uma planta.
A gente se acostuma a coisas demais, para não sofrer. Em doses pequenas, tentando não perceber, vai afastando uma dor aqui, um ressentimento ali, uma revolta acolá. Se o cinema está cheio, a gente senta na primeira fila e torce um pouco o pescoço. Se a praia está contaminada, a gente só molha os pés e sua no resto do corpo. Se o trabalho está duro, a gente se consola pensando no fim de semana. E se no fim de semana não há muito o que fazer, a gente vai dormir cedo e ainda satisfeito porque tem sono atrasado.
A gente se acostuma para não se ralar na aspereza, para preservar a pele.Se acostuma para evitar feridas, sangramentos, para esquivar-se da faca e da baioneta, para poupar o peito.A gente se acostuma para poupar a vida.Que aos poucos se gasta, e que, de tanto acostumar, se perde de si mesma.

quarta-feira, julho 26, 2006

AVISO

Oi gente, só pra avisar que já há um texto depois do "A arte do ato de escrever". Chama-se "A porta", mas ele curiosamente foi postado como sendo anterior a este último. Então tem que descer um pouco para encontrá-lo.
Beijos e obrigada a todos pelos comentários.
Aliás, quem quiser contribuir para o conteúdo do blog pode dar sugestões. O espaço é democrático!

terça-feira, julho 25, 2006

A arte do ato de escrever

Hoje, 25 de julho, é o Dia Nacional do Escritor. Como admiradora e aspirante à profissão, não poderia deixar a data passar em branco. Por isso, resolvi dedicar algumas palavras a este que considero o ato mais prazeroso da vida: escrever. Das diversas formas de expressão cabíveis, a escrita parece ter sido a que consegui desenvolver melhor nesses meus 27 anos de vida e quase 21 de alfabetização. Desde pequena, sempre me pareceu muito fácil utilizar o texto escrito para verbalizar meus sentimentos e minhas idéias. Contar histórias, delirar, desabafar, filosofar, informar, esbravejar, amar e sofrer, enfim, viver através das palavras o mundo que nos cerca. Com a escrita me sinto livre, leve, às avessas. O ato de escrever me acalma e me excita por encontrar nesta fábrica de palavras infinitas possibilidades de criação.
Se quiser falar de guerra, o faço com prazer. Se preferir o amor, datilografo com gozo. O assunto pouco importa desde que consiga me expressar. Em nada e tudo penso enquanto escrevo. Deixo que as déias se deleitem no papel. Como um roda moinho que me lança ao inconsciente deixando que as palavras surjam por si só. O sentido, muitas vezes, pouco importa. E nessas horas é bem provável que significantes e significados pareçam desconexos. Mas é aí que está o valor da escrita.
Um leque variado de opções para usar e abusar do latim, seja o de botequim ou das gramáticas. Brincar com as palavras enche-me de satisfação e enquanto escrevo parece que vou explodir. É, pode parecer exagero, uma hipérbole das mais cafonas, ou até mesmo algo íntimo demais para ser revelado a quem mal conheço. No entanto, esta é a principal razão pelo meu fascínio. Não há nada que me impeça enquanto escrevo. Censura? Vergonha? Essas são palavras vazias se comparadas à sensação de liberdade inside me. Whatever, cara! O ypsilone não faz parte do nosso alfabeto. Mas quem disse que é preciso?
Visse, como certas vezes me faço confusa? O b a ba ficou para trás. Ou como diz a regra, o A vem antes do B? Não precisa responder. Aliás, de pouco valem minhas interrogações. Caso seja do seu gosto, troque-as por exclamações ou vírgulas e tire você suas próprias conclusões (por ironia quase escrevi confusões). Para isso que servem as metáforas e os diversos nomes existentes na gramática. Para explicar os delírios dos escritores que usam e abusam do nosso latim-americanizado.
Mas a cada linha o que mais anseio é quebrar as regras. Antes, porém, é necessário gabarito. Por ironia, fugir da norma culta só é permitido depois que tiver domínio suficiente sobre a língua. O privilégio de parecer despretensioso, sem se passar por um picareta ou ignorante, só é concedido àqueles que realmente conhecem o valor das palavras. É preciso ser Jorge Amado para parafrasear sem vírgulas ou apóstrofes. Ou ser discípulo de Carlos Drumonnd para cair no P da poesia ou do poema. O fato é que ainda não sou nem um nem outro. E não pretendo ser. Em mim guardo apenas a vontade e o impulso de escrever. O que me parece o bastante. E enquanto essas elipses, metonímias e justaposições, aglutinadas ou não, estiverem aqui, vagando em meu pensamento, digo-lhe com veemência: não há quem me faça parar.
Hasta la vista, baby.
Chego às 21h para o jantar.

sexta-feira, julho 21, 2006

DESCULPAS!

OI gente, só queria pedir desculpas pela falta de atualização dos textos. Estou com uma tendinite danada me impossibilitando de escrever. Mas, assim que estiver melhor colocarei a mão na massa. Até porque a cabeça não pára e as idéias se multiplicam. Se Deus quiser, semana que vem estarei recuperada.

segunda-feira, julho 17, 2006

A porta

No caminho há uma porta. Há uma porta no caminho. Há mais ou menos um mês é assim no percurso da minha mesa de trabalho para o banheiro. A porta, que antes ficava permanentemente aberta, por algum motivo fechou, e não sei porque ninguém nunca mais a abriu. Deixe-me explicar melhor. A porta de entrada do banheiro é como uma janela. O vidro foi arrancado. No lugar, ficou um buraco enorme por onde todos agora passam. Só que não dá para transpassá-la totalmente. É preciso levantar o pé bem alto para não tropeçar na moldura de madeira que ali ficou.
A primeira vez que me deparei com esta cena, cruzei com uma pessoa saindo do banheiro. Olhei a porta de cima a baixo e pensei: porque será que ao invés de pular a porta ninguém tenta abri-la? Logo veio a resposta. Uma outra mulher passou por mim rindo, dizendo que achava muito engraçado ter que pular a porta, mas que ela preferia saltar a ter que fazer força. Não achei nada normal. Quando foi a minha vez de passar, abri a porta. De fato ela é bem pesada e o dispositivo que a mantém aberta não funciona mais. Resultado, agora todo mundo pula a porta ao invés de abri-la.
Confesso que não me acostumei com a situação. Toda a vez que tinha que ir ao banheiro pulava a porta meio contrariada. Até perceber que esta é uma boa ilustração da personalidade do brasileiro diante dos problemas. A primeira alternativa é sempre driblá-los, ignorá-los por assim dizer. É o tal jeitinho brasileiro. Para tudo há uma alternativa por mais amadora que seja. Até que chega a hora que improviso nenhum dá jeito. E então já é tarde demais para solucionar o problema.
Basta olhar a nossa política, as nossas escolas, o sistema de saúde do país. Basta ver as ruas cheias de meninos ociosos e improdutivos morrendo de fome. Tudo é reflexo da nossa apatia diante da tragédia. Vemos, nos intrigamos, nos questionamos, mas não agimos. E ao invés de eliminar o obstáculo, passamos a nos acostumar com ele, tornando-o parte da nossa vida. Apenas mais um problema entre tantos outros.
É como se velássemos os olhos na esperança de que um dia tudo melhore por si só, como num passe de mágica. É como se a crise fosse alheia a vida de cada um. É como se o bem maior, o bem de uma nação, se reduzisse ao nosso próprio umbigo. O ser humano perdeu a capacidade de olhar em volta. Só consegue enxergar aquilo que lhe compete: a sua profissão, a sua casa e a sua família. Se tudo estiver certo, o resto pouco importa.
Triste engano. Pois ninguém vive sozinho. Vivemos em sociedade e diariamente somos obrigados a conviver com as mazelas deste povo. Mazelas também fruto da nossa própria inércia. Reclamamos, reclamamos, reclamamos. Mas o que de fato fazemos para mudar o que incomoda? Poucos agem. Muitos discursam. Em época de eleição a frase mais ouvida é "nós vamos fazer", "nós vamos criar", "nós vamos investir", "nós vamos prender". Nós vamos nada!!! Na hora de fazer, a ação vira demagogia.
Hoje, deve fazer um mês que a porta do banheiro está quebrada. Todos os dias, centenas de mulheres passam por ela e ignoram o seu estado. Agora, a madeira está se deteriorando e deixando farpas pelo caminho. A borracha onde o vidro ficava preso se descolou e está pendurada atrapalhando a passagem. Pergunta se alguém reclamou? Pergunta se alguém pediu para consertá-la? Ninguém. Só eu que ainda tive que ouvir do funcionário a resposta: "Ihhh, esquece. Você vai morrer e essa porta vai continuar assim". Bem capaz. Eu só espero estar viva pra conseguir mudar alguma coisa.

Seja você mesma e estará na moda!!!

Gente, olha que maravilha. Por coincidência ou ironia do destino, assim que cheguei em casa após postar este último texto, liguei a TV e dei de cara com uma matéria do São Paulo Fashion Week dizendo que a nova tendência da moda internacional é ter personalidade própria. Quer dizer, segundo os cults (aqueles que ditam nosso comportamento), a partir da próxima estação (ou verão, não sei bem) estar na moda é assumir o estilo próprio. Cada um deve vestir-se, maquiar-se, pentear-se do jeito que se sentir melhor valorizando as suas características naturais.
E não pára por aí. Devido a esta tendência, segundo a reportagem, o número de modelos negros nas passarelas aumentou. E sabem porque? Justamente para acabar com a padronização. Para mostrar a diversidade das etnias. E principalmente, porque os cults estão abolindo a chapinha!!! É sério. Aqueles cabelos alisadíssimos, literalmente chapados vão se tornar démodé (a não ser que o seu já seja assim mesmo!).
Portanto pixains do meu Brasil, nada de rabo, nada de alisamento. Chegou a hora assumir a cabeleira. Enfim, nós do cabelo duro estaremos mais na moda do que nunca, e sem precisar sair de casa. Pena que é preciso alguém falar que é bonito para que o resto aceite. Mas, tudo bem, antes tarde do que nunca. A gente tem que começar por algum lugar. Vai que essa moda pega? E se minha intuição for tão boa quanto meu senso crítico acho que já sei qual será a nova febre feminina: o permanente afro. Se alguém já quiser começar tenho salões ótimos pra indicar!!!!

quarta-feira, julho 12, 2006

Querem acabar com o pixaim!

Virou febre na cidade. A escova progressiva está mais contagiante que o tal rota vírus (aquele que ninguém sabe o que é, mas todo mundo já pegou). Por isso, se você tiver o cabelo um pouco mais encaracolado, tome cuidado. Pode ter certeza que em qualquer lugar, a qualquer hora, vai ter alguém pronto pra te aconselhar o serviço. Basta andar na rua para perceber. Se começarem a te olhar muito é porque estão pensando “ela ia ficar ótima se fizesse a progressiva”.
A fixação é tanta que outro dia cheguei no cabeleireiro e perguntei: tem hora pra fazer a mão? E o cara imediatamente respondeu com a interrogação: você não quer fazer uma progressiva? Fiquei pasma com a falta de senso do coitado. Mas não hesitei. Respondi em alto, seco e bom tom: não!!! Virei as costas, saí e fui fazer a unha no salão em frente.
Nada contra quem faz, afinal mudar um pouco é sempre bom. O problema é essa neurose conjunta que todas mulheres entraram por causa de uma escova. Quem tem cabelo liso ainda vai. Dá uma ajeitada, hidrata o cabelo, sei lá. Agora eu, que tenho uma juba super encaracolada, não dá.
Chega até ser engraçado. Todo mundo tem uma opinião formada sobre o assunto. Ou já fez ou conhece alguém que tenho feito. Outro dia, contei pra uma amiga que muitas pessoas me aconselharam fazer a tal. Ela me disse na hora “Não faz! Quem disse isso é porque tem inveja de você e quer te ver feia. Minha irmã tem o cabelo igual ao teu, fez e ficou horrível” (dá pra notar o grau da paranóia?).
Na verdade, o que me preocupa não é exatamente a escova, mas o que está por trás dela. E o que vejo é uma padronização absoluta do belo. Uma idéia de beleza que em nada tem a ver com a nossa raça e origem. Primeiro veio a mania de magreza. Todo mundo tem quer ser macérrimo, sem bunda, com a perna fina, daquele jeito que basta dar um peteleco pra pessoa ir longe. Depois veio o peitão siliconado. Agora, todo mundo tem que ter cabelo liso, de preferência, escovado e louro. Daqui a pouco o Rio vai se transformar em uma grande Barra da Tijuca onde todas as mulheres usam salto, fazem luzes e escovam a cabeça antes de ir pro samba na praia (me desculpe quem mora na Barra, mas é verdade!).
Parece-me um problema crônico do brasileiro não valorizar o que tem. E pior, importar os piores costumes. O natal, por exemplo, já pararam pra pensar em culto mais inadequado ao Brasil? O que o Papai Noel, que mora lá na terra do gelo, tem a ver com o nosso país tropical? Em pleno verão as pessoas colocam presentes em volta de pinheiros e fazem nevar na rua a uma temperatura ambiente de 40º C. É ou nãó é forçação demais?
Será que viveremos eternamente numa colônia? Será que nunca deixaremos de ser meros importadores de cultura para nos tornarmos criadores genuinamente nacionais? Essa mania de ficar copiando a estética lá da Escandinávia não dá. O brasileiro tem estilo próprio. É do corpo violão, do rebolado, do cabelo crespo, liso e ondulado. É um povo mestiço que tem justamente na diversidade a sua beleza. Mas não, ficam os cults ditando moda e querendo fazer todo mundo ser igual. Pior, igual às modelos das revistas sem oferecer a ajuda do photoshop.
Claro que vaidade é importante. Todos querem se sentir bem de frente pro espelho. Mas pra isso temos que ser um pouco mais generosos com nós mesmos. Se aceitar mais. Se satisfazer com o possível e não com uma imagem inatingível que alguém classificou como ideal. Belo também é sinônimo de saúde interior. Consumir cultura pode ser bem mais embelezador e muito menos cansativo. O segredo está no equilíbrio. E principalmente, em admirar a diferença. Afinal, será que eu posso gostar do meu cabelo cheio e enrolado?
Pelo visto a maioria acha que não, e se pudesse já teria me tacado debaixo do secador. Tudo bem, eu entendo. Sei que o conselho é pro bem. Mas por enquanto eu vou ficar a margem, torcendo para que essa mistura de formol com queratina queimando no coro cabeludo não cause maiores danos cerebrais às mulheres. Senão é capaz de 90% da população feminina ficar meio limitada pra sempre. Já pensaram? Deus me livre! Se for pra correr esse risco prefiro gastar tempo, dinheiro e neurônios no analista! O custo benefício é bem melhor.
ps: amigas que fazem e amam escova progressiva. Amigas que me aconselham o uso (sei que é por bem!)não fiquem bravas. É que não poderia deixar de comentar sobre esse fenômeno estético social neurótico compulsivo! É muita pressão na cabeleira!!!!

segunda-feira, julho 10, 2006

Barbárie ou civilização?

A situação do país anda realmente preocupante. Após a rebelião de presos ocorrida em São Paulo no mês passado, as matanças continuam dentro e fora dos presídios. Já chegam a seis o número de agentes penitenciários mortos em menos de 10 dias nas terras de Alckmin, e aqui no Rio, dois policiais foram mortos, acreditem, porque um tentou assaltar o outro. É praticamente impossível se sentir seguro num lugar onde não se sabe mais quem é ou não um fora da lei. Assim como a máxima “todo o político é corrupto”, outra terá que ser empregada no nosso vocabulário: todo o policial é ladrão. Quer dizer, estamos fritos! Porque se os governantes (teoricamente eleitos para nos ajudar) roubam os cofres públicos e os policiais (teoricamente treinados para nos proteger) querem agora roubar nossos bens pessoais, nada mais nos resta. Não há a quem recorrer.
Basta abrir o jornal para se ter a prova. Cada dia é uma roubalheira diferente. Máfia do mensalão, máfia das ambulâncias, máfia dos correios, chacina na favela, chacina no presídio, é uma barbárie sem fim. Agora mais essa: um policial recém contratado, com seis meses de carreira, assaltando gente por aí. O “azar” foi não saber que a vítima era um sargento que, claro, estava armado, e claro reagiu. Resultado: os dois foram pra cova. Cada um com sua farda e sua história.
Segundo a teoria da evolução cultural de Morgan, o homem passou por três estágios de desenvolvimento: selvageria, barbárie e civilização. Este último, a qual vivemos agora, seria o auge de nossa capacidade criativa e de domínio das técnicas e da natureza. De fato ele está certo. Pena que o homem em seu processo evolutivo tenha regredido tanto eticamente, e ao invés de utilizar sua inteligência para o bem, escolheu o contrário. Parece que quanto mais aprendemos mais destrutivos ficamos e menos investimos na felicidade do mundo. Antes estivéssemos lá no início da linha. Pelo menos seríamos selvagens e não teríamos tanto do que se envergonhar (se bem que vergonha atualmente só tem quem é honesto).
O Brasil hoje não tem nada de civilizado. Chegou até aqui para continuar uma selva, onde além dos famintos há os gananciosos, nunca satisfeitos com o que já têm. Querendo sempre mais custe o que custar. Afinal, tudo tem seu preço. Lei pra quê se existe o dinheiro? Vive-se pra tê-lo, mata-se por ele. É o bem soberano, o mal da civilização. Por conta dele, viramos bichos acuados numa terra de ninguém. Onde todos querem ser leões e reis. Onde não há ordem e o que impera é o caos.
Pior que nem adianta pedir socorro porque não tem ninguém pra te ajudar. É tempo de guerra na selva civilizada. Melhor correr pra toca antes que alguma raposa te pegue pelo rabo.
Deus nos acuda e salve-se quem puder!

quarta-feira, julho 05, 2006

Não sei quem é pior irmã mais velha ou o diabo

Irmã mais velha quando quer ser má consegue ser pior do que o diabo. Minto, é o próprio encarnado a sua imagem e semelhança. Para meu desespero, nasci a caçula de uma leva de quatro mulheres. Quer dizer, tenho três demônios acima de mim. Entre todas elas, sem dúvida, a primogênita, Bruna, é a pior. Afinal, ela é a primeira, não há ninguém acima dela. Para os psicólogos, esse traço de sarcasmo é facilmente explicado pela perda de espaço. Ou seja, de filha única ela passou a ser mais uma. E já que nós crowdiamos o pico dela, temos que sofrer algumas conseqüências.
Relembrando os fatos mais marcantes, aqueles que ficam como trauma para o resto da vida, chego a conclusão de que Bruna era má, mas com muita criatividade. Sua perversidade não se limitava a puxões de cabelo, beliscões ou tapas, como sugere a lei natural da força. O terror era psicológico. Hoje, que somos mulheres crescidas, e esses conflitos freudianos foram superados (supostamente), conseguimos analisar mais friamente cada episódio. Até nos damos a liberdade de rir deles. Ao contrário do momento em que aconteceram.
O primeiro foi com a Helô, a terceira da fila. Quem conhece nossa família sabe que ela é bem diferente de nós. Foi a única que nasceu de olhos castanhos (que azar), cabelo liso e bunduda (ehehh). Nós seguimos uma linhagem afro-européia (acabei de inventar): louras, olhos verdes e cabelo sarará. Por isso, a dúvida quanto ao seu parentesco foi sempre duvidosa (agora quem está sendo má sou eu).
Claro que tudo não passava de brincadeira. Até que a Bruna resolveu transformar o "causo" em coisa séria. No dia do aniversário de sete anos da pobre, ela levou a Helô para o quarto e disse que precisava ter uma conversa muito séria com ela. Sentou-a na cama, segurou sua mão e disse olhando bem no fundo dos olhos dela: “Agora que você já está grande e tem maturidade suficiente para saber toda a verdade, o papai pediu pra eu contar pra você. Você é adotada. Eles te encontraram na lata do lixo e te trouxeram para casa”.
Eu não estava lá para ver, mas acredito que a cara da Helô deve ter ficado branca. Não demorou muito e ela abriu o berreiro, óbvio. “É mentira”, gritava. E chorava, chorava, desesperada. Até que o sofrimento se transformou em ódio e Helô não pensou duas vezes. Saiu correndo até a cozinha, pegou uma faca e voltou para matar a Bruna. (acreditem, isso aconteceu na minha casa). “Eu vou te matar, sua mentirosa”. E vocês pensam que a Bruna se deu por medrosa? Nada. Continuou repetindo a história e chamando a pobre de louca. Agora vejam o requinte de crueldade desta irmã! No fim, acho que tudo acabou em castigo.
Comigo o terror foi mais impessoal. Era um dia normal como todos os outros. Já era noite. Nós morávamos numa casa grande, de quatro quartos, num condomínio bem silencioso. Eu devia ter no máximo quatro anos de idade quando a Bruna, que já tinha seus 13, entrou no meu quarto, trancou a porta e guardou a chave. Pegou uma tesoura e fingiu se matar. Caiu estatelada entre a minha cama (que eu estava deitada) e a porta. Meu primeiro impulso foi tentar sair do quarto. Mas quando fui passar, ela me impediu levantando o braço com a tesoura apontada para cima. Eu comecei a chorar. Ela apagou a luz. Eu corri para trás de um cesto de brinquedos que tinha no canto do quarto e fiquei encolhida chorando baixinho. Enquanto isso, ela ficava arrastando a tesoura no chão. Só dava para ouvir o meu soluço e o barulho de crac, crac, crac, crac. Quando já não tinha mais lágrima (devia estar uns dez minutos encolhida sem me mover), acho que ela cansou. Simplesmente levantou e saiu do quarto sem dizer nada.
E assim eu me salvei. Porque me curar mesmo, só foi possível depois que a quinta filha nasceu. Para minha sorte meu pai se casou novamente e teve a Pri. Era a minha chance de ser a mais velha e descontar tudo o que havia sofrido em 10 anos de caçula. Costumávamos passar as férias em Angra. Sem nada pra fazer e tendo aprendido muito bem a lição, minha diversão favorita era maltratar a nova caçulinha.
Lembro-me de um dia que o papai saiu de barco e eu fiquei com a Pri. Num certo momento ela começou a chorar, e queria porque queria encontrar com eles. Cortei logo. “Pri, o papai e a sua mãe foram embora pro Rio e te deixaram aí. Você vai ficar sozinha comigo. Nunca mais eles vão vir te buscar”. A coitadinha chorava sem parar e eu fingindo ser muito boa, dizendo que ia cuidar dela, aquelas coisas. Fomos para o quarto do hotel. Pra piorar tranquei-a no quarto e saí. (ahahhahah, foi divertido). Mas eu não era tão perversa quanto a Bruna. Na verdade, só deixei ela chorar um pouquinho. Fiquei escutando atrás da porta e quando percebi o desespero dela desisti da maldade e passamos o resto da noite brincando.
Acho que a única que não caiu nas maldades da Bruna foi a Bia devido à proximidade de idades. Sei que elas brigavam muito, mas era de igual pra igual. Ou se não me engano a Bia ganhava a briga. Eu, particularmente acho isso ótimo. Pelo menos a Bruna não ficou impune diante de tantas maldades. Coincidência ou não, adivinhem qual a profissão dela atualmente? Psicóloga. Especializada em quê? Crianças (é ou não é muita bandeira?).

ps: as histórias são verídicas, mas os nomes são fictícios para preservar a identidade/privacidade de minhas irmãs.


segunda-feira, julho 03, 2006

Triste começo, amargo fim.

Pronto, agora que a copa acabou (para nós) posso falar o que quiser. Chega de ficar calada! Diante do que fomos obrigados a assistir, aliás, o mundo inteiro, tenho que desabafar. Não há nada que justifique a apatia da seleção brasileira nesta copa do mundo. E não foi só contra a França. Foi em todos os jogos. Mesmo com as vitórias estávamos sempre com aquele gostinho de quero mais, com a sensação de que faltava alguma coisa. E faltava. Muita coisa. Não só bom futebol como garra, vibração, vontade. Com exceção de Lucio, Ruan e Zé Roberto, nenhuma de nossas grandes estrelas titulares conseguiu brilhar e jogar o que sabe.
O Brasil perdeu pela falta de time, de conjunto, e porque seu principal maestro não soube organizar a sua orquestra. Nosso técnico tinha nas mãos a melhor seleção dos últimos tempos e ainda sim conseguiu voltar pra casa sem convencer ninguém. Prepotência, lobby, teimosia? Acho que um pouco de tudo. Como os próprios jogadores disseram, eles não esperavam a derrota. Exatamente por isso ela chegou ainda mais rápido.
O tal esperado futebol brasileiro ficou lá no Barcelona, no Real Madri, Lion, em qualquer outro lugar distante da nossa pátria verde e amarela. Afinal, são eles que pagam os salários da maioria de nossos jogadores. Talvez por isso fique difícil sentir o peso da camisa canarinha, da responsabilidade de vesti-la. Porque pra jogar na seleção não basta apenas técnica. Tem que ter coração em campo, compromisso com a bandeira. A gente quer ver a conquista de um grupo. Mas não, o que assistimos foi um espetáculo de individualismo. Cada qual querendo bater o seu recorde e sua marca.
E onde estava o capitão nesta hora pra chamar o time pro jogo? Onde estava o técnico? Estavam lá emudecidos, apáticos, sem demonstrar qualquer sentimento diante da derrota. Muito diferente das outras copas. Basta lembrar daquele time de 94 que lutou até o fim para nos trazer o tão esperado tetra. Do Dunga, no seu papel de líder, brigando com seus companheiros quando sentia que estavam se entregando. Do Zagalo, em 98, no meio do campo antes dos pênaltis contra a Holanda incentivando cada jogador, buscando em cada um deles a confiança e a consciência do que é estar ali. Nada disso foi visto agora. Vimos apenas um projeto de time que ficou no sonho e não passou de ilusão.
De quem é a culpa? Do Parreira, principalmente. Da teimosia, arrogância e prepotência de quem se acha invencível e dono da verdade. Ele errou feio e todo mundo viu. Equivocou-se na sua insistência. Deixou os melhores no banco mesmo após todas as provas dadas em campo. Por esse lado foi bom ter perdido. Seria injusto ele ter o gosto da vitória. Pena que o preço tenha sido caro demais para nós torcedores, que de mãos atadas fomos obrigados a engolir a seco o amargo da derrota.
Que venha 2010! África do Sul vamos nós. Desta vez sem Parreira, Cafu e Roberto Carlos, pelo amor de Deus!!!